segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Tílburi

Um cabriolé de dois lugares cruzou a praça defronte ao Theatro Municipal de um tempo antigo - talvez 1926. Nele vinham Leopoldo e Odalina, bêbados de um amor carioca que ganhava os espaços. O assento era bem moldado e os corpos dos dois tinham um pequeno pudor delicado do toque, mas as intenções eram bonitas e singelas, carregadas de um ardor romântico dos antigos casais. Ela usava um perfume cuja essência comprava numa boutique recomendada por sua amiga de muita distinção, Laurinda. Os efeitos do odor eram aplicados a Leopoldo, que se aproximava galante da nuca da moça. Alguns fios de cabelo dela se colavam suados próximos ao pescoço e um riso de gaivota percorria a trilha de pedras. Ele usava um bigode muito bem desenhado, um chapéu fino e sapatos que lhe davam uma condição superior.

Os cavalos pareciam trôpegos e animados pela noite de veraneio. Uma brisa de mormaço corria pelos cabelos e os relinchos e trotes traziam à cena uma atmosfera de prazer único. O tílburi dava largas voltas em suas rodas e os levava por paisagens que eram arquitetadas de quietude e esplendor.

Eu os imagino neste carro perdido no passado, rodando rodas pelos caminhos do Rio, trocando beijos e farejando o cheiro de dama-da-noite, olhando felizes uma lua que explora sua redondeza branca e ouvindo de longe, no mato, grilos que se somam ao som de um chorinho que se apresenta mais distante ainda.

A partir do momento em que os imagino, eles existem. E ficam perdidos nessa felicidade eterna de vaguear à mando dos cavalos por ruas calcadas de alegria e promessas de amor por toda a eternidade.


Marcelo Asth

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