sábado, 18 de dezembro de 2010

Pontiagudo

                Quando tudo soa como injustiça é porque estamos com parâmetros errados pra se avaliar. Quem somos nós pra maldizer o tempo, se este nos embala quando tentamos entender todo o balanço da nau? Tudo é vertigem, pode gerar vômito, deixar os olhos cansados de instabilidade. Mas isso pode virar dança simples, sem técnicas de passo – aquela dança de inquietação, que faz vento virar a música perfeita pra soprar os passos. E dançar por dançar, mesmo que a sós consigo, por um salão do convés dessa nau. Na popa, de vento em popa, como pipa empoleirada no susto, faz-se a regência do deixar-se levar, distante pra algum lugar que você mesmo se carrega.
                Não vamos entender o interessante, as comoções que inventamos e consumamos pra consumir nosso estado de ser e estar. Não temos o direito de contrariar a saudade, mas devemos olhar o passado como acessamos um retrato. E se a lágrima não escapa, obstrui algum canal da verdade. Mas podem-se deixar as lágrimas evaporarem pra nublar a angústia de uma solidão que dói como faca espetando. Não desembainho minha espada pontiaguda, mas mesmo assim, só de vê-la, grito de dor um berro espancado no timbre. Meu suicídio seria deixar-me levar num rio lacrimal e beber todo o conteúdo pra me afogar em mim mesmo.  

Marcelo Asth

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