quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Ebriedade

A cabeça está girando. Estou a sentir o subitâneo sentimento que sobe ao crânio e faz do cérebro seu fantoche. Sou todo espectador. Quero que uma emoção se cole na mente e desgringole qualquer coisa que não seja surpresa. Quero que eu mesmo me esforce na tentativa de fazer querer-me. Uma taça de vinho na mão direita, girando, redeimonho cor de vinho, rodopiando olores.

Palmas pra sensação! As palmas das duas mãos descem pelo corpo me descobrindo de outra forma. Estou acompanhado e sorrio lépido, lesto.

Há tempos decidi me fantasiar de outros, mas agora que me permaneço, cedo às instâncias de mim. Não estou nem um pouco racional. Se aqui relato é porque sinto. E quem sente não teme a nada, até porque sou esse tudo perdido no vazio, espetacular e soberano. Sou um corredor de sensações e meu corpo vira um grande circo. Meu cerebelo foi sequestrado.  Por mim se penduram estas notas acrobatas de música, o hálito parece cuspir fogo e eu ando numa linha enquanto o povo ruge com estalar dos chicotes que minha língua estala numa nuca específica.

É essa coisa de sentir, ou quase sentir. Meu corpo é dono do mundo. Esta nuca vai se abrindo pra mim e se desvendando corpo. Cachos enegrecidos, mais uma taça de vinho, um sorriso que é recheado da mesma embriaguez e me eleva à altura. O mundo gira e agora isso é perceptível.

O outro corpo me invade. Nada é cedo e nada é tarde; o tempo está apenas de figuração. Sei que a música me bebe e a gente dança, rodopia, inventa passos e se apalpa. A boca abre instantânea, as pernas coçam umas às outras. A gente se desgasta e ao mesmo tempo se enche de energia. As cores da aura mudam, mesmo que imperceptíveis. Ficam cor de vinho, girando, girando, em ebriedade.


Marcelo Asth


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