Tem alguém falando de mim. A orelha esquerda arde e eu tenho certeza. A tarde em que me encontro é regada da serenidade dos lusco-fuscos. Tenho medo dessa hora quando a noite toma o dia. É um momento de mariposa desesperada, não adianta acender a lâmpada, me torno frágil, há alguém que fala, discursa, maltrata, me cala. Daqui do alto do morro observo o movimento sutil em que as casas lá de baixo começam a brilhar. Os outros do vilarejo sabem de minha existência?
Os meus olhos já não alcançam tão longe. Hoje não vou dormir em minha companhia, quero sair daqui de casa sem esperar a minha volta, caminhar nos contornos da montanha. Coloco o banquinho próximo à porta, preparo a lenha do fogão e fervo a água para o café. Saio de casa e deixo tudo como está, o fogo tremendo, chispando, a água fugindo, o café esperando. Retorno no tempo certo. Retorno pra outra cidade, da qual parti quando me sentia como essa mariposa desesperada. O gosto ainda na língua e a lembrança no fundo do copo. Se eu fosse árabe, lia o futuro na borra, mas deixo que a linha da mão me discorra o fundo do fim que corre como o trem que atropela os ventos.
Há um sussurro martelando no ouvido esquerdo. Se eu fosse saudade, ensurdecia as origens.
Eleonor Manns
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