quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Dentes-de-leão


Quando eu era criança, amputava com minhas mãos inexatas e inocentes as hastes frágeis dos dentes-de-leão. Daí, dono daquela leve efemeridade, soprava com a força de um Zéfiro o pólen branco que se dividia aéreo como projéteis vivos. E de repente me via com cabinhos verdes na mão, sem graça, bobos. Não me eram mais úteis. Então, jogava-os na grama. Ali aprendi a espalhar o que agarrava com firmeza e jogar fora o que não me prestava. E quando a gente espalha algo, sabe que não é mais nosso, que vai além. Eu teria polinizado algum canteiro verde com minha ação de vento.
Hoje, parece que amputo meus pensamentos – campos sem-fim de dentes-de-leão. E com eles na mente, sopro com um pulmão limitado, débil e enfermo, o que posso pra fora. Expiração de esforço, lobo mau derrubando castelos dos grandes. Metade dos pensamentos bate no ventilador da sala - meu moinho quixotesco -, metade alcança uma parábola decrescente e mira o chão. Talvez um pensamento apenas voe na direção certa. Esse, espero que polinize o campo verde que quero reproduzir. Ainda pode estar vagando, curtindo as ondas do ar. E é meu desejo agora guardar os cabinhos pra uma coleção de fracasso.

Marcelo Asth

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